segunda-feira, 16 de abril de 2018

Daniel Ricciardo pode não ser um gênio, mas sem dúvida é genial

"Daniel Ricciardo é o Gilles Villeneuve dos tempos atuais – um piloto que não precisa ser campeão do mundo para ter seu nome lembrado daqui a décadas"





Eu tenho o costume de dizer que corridas valem mais do que campeonatos, o que ao bater o olho pode parecer uma afirmação sem sentido. É claro que um campeonato constitui um desafio e possui uma dimensão que não se compara ao valor de um GP sozinho. Mas corridas algumas vezes são subjugadas em nome de campeonatos... A soma de pontos que torna um piloto campeão é algo, digamos, abstrato. Trata-se de uma virtual soma de números que se reflete num pedaço de papel ou tela de um computador. Já as corridas são – ou deveriam ser – algo muito mais real, algo concreto que se materializa diante dos nossos olhos e que tem a capacidade de nos atingir como o domingo de Fórmula 1 em Xangai nos atingiu.

Não seria leviano constatar que o que se passou dentro da pista no GP da China supera, por si só, campeonatos inteiros que vimos no passado. Se me perguntarem, eu não trocaria a corrida de Xangai por todo o campeonato de 2002, ou o de 2004 talvez...

Assistimos a vários lances dignos de levantar-se da cadeira na corrida chinesa, mas nada chega ao nível do que fez Daniel Ricciardo. O australiano na quinta-feira já declarava que teria partido para o ataque no Bahrein caso estivesse ele em 2º e entrasse na última volta com o carro tão próximo da Ferrari de Vettel (quem acompanhou entrevistas via imprensa internacional percebeu que ele tocou no assunto até em momentos em que não foi perguntado). E então poucos dias depois de “cutucar” Bottas, Daniel prova com ações que não há como duvidar dele quando o assunto é ultrapassagem.

Este garoto já está na Fórmula 1 desde 2011. Este garoto – que no Café com Velocidade já batizei de “ultrapassador” – nos brinda com manobras como essas desde 2014, quando ascendeu à Red Bull. Daniel Ricciardo é o Gilles Villeneuve dos tempos atuais – um piloto que não precisa ser campeão do mundo para poder ser lembrado daqui a décadas, a não ser por aqueles que se apegam mais a números do que a atuações dentro da pista, o que definitivamente não é o meu caso.

Existem ultrapassagens e ultrapassagens, e as que esse australiano executa são de uma técnica tão peculiar, e ainda melhor, são de uma OUSADIA tão visível que até um leigo ou aquele que assiste a um GP pela primeira vez é capaz de notar a diferença. Mais do que um piloto com talento (como vários outros do grid) o que diferencia Ricciardo é seu ÍMPETO, é o fato de transformar em realidade aquilo que passa na cabeça de 98,4% dos pilotos quando estão colados no carro da frente.

Ricciardo faz bem ao automobilismo não porque guia bem, porque sorri toda hora ou porque é sincero em entrevistas. Ricciardo faz bem ao automobilismo porque mostra como ultrapassagens dão vida a uma corrida, e como arrojo e técnica podem e devem ser colocados em prática. O ataque final a Bottas na curva 6 de Xangai deveria ser exibido em cursos de pilotagem.





Daniel estará sem contrato ao final do ano. Não tenho informações do seu futuro, mas me parece impensável que Ferrari ou Mercedes não estejam alinhando ou já efetivando propostas para “seduzir” o australiano. Quanto vale Ricciardo em comparação com alguns (bons) finlandeses que estão grid atual da Fórmula 1? Daqui desse cantinho, torço para que renove com a Red Bull, pelo simples fato dos austríacos não engessarem disputas internas entre companheiros, algo que seus rivais fizeram em tempos recentes. A Red Bull já lidou, mais de uma vez, com toques e acidentes entre seus pilotos, e nem por isso optou pelo “empresarialmente correto” caminho da proibição.

Não vi pilotar o "Villeneuve pai", o que constitui talvez a grande frustração da minha “vida automobilística” – juntamente com Jim Clark, dois nomes que eu trocaria muita coisa para poder ter a chance de assisti-los com meus próprios olhos. O que vi de Gilles foram algumas de suas manobras magistrais. Sei que não foi campeão do mundo, mas sei que guiava com técnica incrível, com ousadia e com arrojo. O que sei é que não precisou de resultados para entrar no grupo dos grandes da Fórmula 1.

Assim como Daniel Ricciardo...

10 comentários:

  1. Show. Falou por mim o que não consigo escrever.

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  2. Fabio, grande comentário, alias como todos em seu blog, contudo, se vc me permite discordar com todo respeito que tenho por suas analises dos GPs, acho uma heresia comparar Ricciardo com Gilles Villeneuve.
    As ultrapassagens do Daniel foram colaboradas por um jogo de pneus, que emprestou ao carro, naquela fase da prova, uma superioridade incrivel sobre Ferrari e Mercedes, aliando-se a isso, possibilidade de abertura de asa e claro como grande piloto que é, aproveitou o momento previlegiado para vencer.
    As magníficas corridas de Gilles eram a bordo de uma Ferrari longe de ser o melhor carro do grid, a famosa disputa com Arnoux, valia o segundo lugar, de igual para igual, sem subterfugios tornando o carro mais veloz que do oponente, usava pericia, controle do carro, talento e muito arrojo.

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    1. Antonio, interessante seu comentário, até porque permite o esclarecimento: Eu não disse que Ricciardo iguala Villeneuve em todos os quesitos. Até fiz questão de ressaltar que não assisti corridas de Gilles. O que comparei é a imagem de bravura e belas manobras que temos do canadense, e que seria ótimo se ocorresse o mesmo com Ricciardo.

      Quanto a questão dos pneus, é verdadeira, mas as MANOBRAS de Daniel a meu ver vão além da simples vantagem da borracha. Você há de convir que, embora seja o caso da China, não é a 1ª nem a 2ª vez que o australiano exibe a qualidade "em ataques" que vimos no domingo.

      Cada um a seu tempo e sem dúvida que Villeneuve pertenceu a uma Fórmula 1 que felizmente o permitiu mostrar o máximo do seu talento. Mas cada um deles, a seu modo, podem ter qualidades semelhantes. A sua caracterização de "pericia, controle do carro, talento e muito arrojo" eu enxergo em Ricciardo, e a ideia foi apenas lembrar de outro piloto que também as possuía.

      Sempre bom ler seus comments no blog (já li e dei pitacos em todos até aqui).

      Abs!

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    2. Fabio, legal sua idéia de responder os comentários postados no blog, o que para nós apaixonados por carros e corridas, é ótimo absorver um pouco do seu conhecimento sobre F1.
      Vejo no Ricciardo um excelente piloto, o coloco entre os tres melhores da categoria neste momento. Ando muito incomodado com os atuais rumos dos GPs, tres provas, tres vitórias dos boxes, a Red Bull só venceu, após o safet car, por estar um segundo e meio mais rápida que os demais, acho uma coisa artificial.
      Dentro de um certo saudosismo, tendo a supor que pilotos como Gilles eram bem melhores que os dessa geração.
      VC está certo em sua resposta.
      Obrigado, um abraço.

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    3. Claro que é questão de ponto de vista, mas não tenho a leitura do GP da China de uma corrida em que a "vitória foi dos boxes". A razão do texto acima reside justamente na ação dentro da pista. Uma coisa é ter um GP em que os carros vão para os boxes, trocam de posições e assim permanecem até o final da corrida. Outra bem diferente é a estratégia devolver um piloto para a pista em condições de brigar e ultrapassar.

      Na minha visão, há uma grande diferença entre o GP da Austrália e o da China. Não as enxergo como corridas semelhantes. Uma teve troca nos pits e mais nada, a outra teve troca nos pits e por isso muita ação na pista.

      Abraços!

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  3. Acho curioso é que as pessoas falam dessa corrida e se referem a ela como "chata até a batida das Toro Rosso". Será que corridas têm que ser frenéticas o tempo inteiro para que se tornem memoráveis? Existem provas que se tornam lendárias por apenas uma ultrapassagem, uma briga ou um piloto. Outro dia as mesmas pessoas lembraram do GP da Europa de 1993, como se tivesse sido uma grande prova, super emocionante e tal. Desafio: esta corrida pode ser encontrada facilmente no Youtube. Assistam todas as voltas e vejam se o que tivemos não foi apenas uma primeira volta magistral e pronto.

    Por mim, se o campeonato for composto de GP's da China até o final do ano, está de ótimo tamanho.

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    1. Mas me preocupa um pouco pensar em uma quase "dependência" do Safety Car para a corrida esquentar. Na minha visão, o GP da China foi ótimo, mas não apaga nenhum dos problemas que a categoria possui. De qualquer maneira, Safety Car é algo que sempre terá chance de aparecer.

      Triste a meu ver é o tal do Safety Car Virtual. Que tipo de campeonato estaríamos analisando se na Austrália e na China tivéssemos essa interrupção "parcial" e sem o agrupamento do pelotão?

      Pra pensar...

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    2. Imagine se um dia ficar quase impossível fazer gol no futebol, criam-se, então regras para tornar o jogo, de certa forma interessante. Os times entrariam em campo com atletas descalços, outros com chuteiras, alguns de tênis, ao longo da partida poderiam revezar tais calçados e cada equipe, claro, montaria sua estratégia.
      O novo regulamento, também, iria prever que o time detentor do maior número de passes certos em três fases do jogo, elimina um jogador adversário.
      Suponhamos que aos 30 minutos do segundo tempo, um time tenha dois jogadores a mais, todos de chuteira ou tênis, enquanto o oponente corra pelo campo de pés no chão. AH!, veríamos tabelas, dribles e gols, nesse periodo da partida.
      Evidente que o GP da China foi legal, porém me incomoda os resultados obtidos pelos boxes, por um composto de pneus, pelo estrategista da equipe.
      Japão 1988, Senna tem problemas na largada, cai para décimo quarto, inicia um processo de recuperação, executando varias ultrapassagens, até assumir a ponta 30 voltas depois, sobre um Prost com o mesmo equipamento. Surpreendente Thierry com uma Benetton, à época equipe média, vir acompanhando o brasileiro, ganhando varias posições e terminar em terceiro, só não conseguindo sobrepujar Prost, o segundo colocado. Sem Safety Car, sem estratégia de pneus.
      Campeonato de 1983, Piquet campeão, venceu três corridas, Prost vice. três vitórias, as demais etapas, varios pilotos revezaram-se no topo do Pódio, Patrese, Arnoux, Tambay, Keke Rosberg e diversos times, Ferrari, Willians, Maclaren, Brabham etc.
      Quem viu esses Gps, imprevisiveis, varios candidatos a vitória, times competitivos entre si, tudo resolvido na pista, no talento, frustra-se com a F1 atual.

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    3. Bem colocado, Antônio, embora eu não considere o GP da China "decidido pelos boxes". O pit stop da Red Bull foi fundamental, mas se não fosse executado na pista o plano não teria sido efetivo por completo.

      Abraços.

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