Quem apostaria que um
evento da FIA voltaria a acontecer em um dos palcos mais místicos da história
do automobilismo
“Assistir ao GP em
Nordschleife me fez pensar em como o automobilismo foi, ou vai, se apequenando
ao longo dos anos, como vai se tornando cada vez mais um esporte de bibelôs, de
meninos hábeis e envoltos de segurança exagerada, e vem deixando de ser uma
atividade para aqueles que já foram os seres mais corajosos, de maior bravura,
e cujo objetivo ao se tornarem pilotos era o de superar, no braço, as
dificuldades que uma pista e um carro lhes impunham”
Texto publicado em 19/05/2015 no site Velocidade
O
velho Nurburgring.... Uma oportunidade de ouro.... Quem gosta de automobilismo,
e quem gosta acima de tudo de conhecer a história da Fórmula 1 e das corridas
em geral teve neste último final de semana uma chance rara. Passados 39 anos
após sediar sua última corrida de Fórmula 1, o traçado de Nordschleife em
Nurburgring voltou a receber uma competição oficial da FIA.
Para
quem não sabe, trata-se do circuito de cerca de 25 km que a Fórmula 1 percorreu
por 22 vezes entre 1951 e 1976... Era um dos palcos mais fascinantes das
corridas de automóveis, até que o acidente quase fatal de Niki Lauda
interrompeu a história que a categoria máxima do automobilismo construiu no
mítico palco, um dos mais desafiadores entre todos já criados, pode-se afirmar
sem medo de errar. Niki Lauda escapou da morte naquele 1º de Agosto de 1976. O
traçado de Nordschleife não. Pelo menos para o universo do automobilismo de
ponta, naquele dia quem morreu foi a pista..... Foi exumada do calendário e
condenada a ponto turístico... Até
chegar este maio de 2015...
O
WTCC trouxe de volta a chance de todos admirarmos as curvas magistrais da pista
que invade a floresta, da pista que tem subidas e descidas altamente
desafiadoras, da pista que já tirou a vida de vários pilotos de Fórmula 1 (como
o argentino Onofre Marimon, em 1954 , o inglês Peter Collins em 1958, o
holandês Carel de Beaufort em 1964, o também inglês John Taylor em 66 e o
alemão Gerhard Mittler em 1969 – isto apenas para citar pilotos que morreram ao
volante de um Fórmula 1, sem incluir aqueles que perderam suas vidas na pista
ao volante de carros de outras categorias). Se você ainda não assistiu, e se
tem um mínimo de interesse no lado mais brilhante de uma corrida de carros, não
deixe de ver. É absolutamente impressionante ver a beleza do traçado, a variedade do traçado, as tomadas
aéreas, as pessoas próximas à pista, enfim, a atmosfera de um lugar que
contribuiu e muito para o automobilismo se tornar sinônimo de coragem, de
bravura e de desafio.
Numa
atitude que contraria suas próprias decisões na história recente, já que é ela
uma das responsáveis pela aniquilação de autódromos tradicionais (seja cortando
seus traçados ao meio ou eliminando do calendário mundial pistas que são
verdadeiros desafios aos seres humanos que por elas pilotam), a Federação
Internacional de Automobilismo deu o aval para uma corrida que jamais poderia
ter ficado tanto tempo longe dos olhos de uma geração inteira que cresceu
assistindo corridas, e ouvindo as histórias do “Inferno Verde” – apelido dado
por Jackie Stewart.
Durante
todos esses anos, Nordschleife esteve apenas no nosso imaginário, no máximo
como traçado de algum simulador desses que iludem as pessoas que pensam que um simples
jogo se assemelha ao desafio e à perícia que pistas como essa exigem na
realidade. Durante todos esses anos, Nordschleife se tornou parte de um passado
que parecia fadado a ser apreciado apenas nos arquivos das corridas.
É
incrível como a mentalidade das pessoas que comandam o automobilismo fez com
que todos acreditassem que era impossível correr em pistas longas, seja por
razões de segurança, por imposição da TV, ou até pelo patético argumento que
uma corrida precisa ter 70 e tantas voltas para que placas de publicidade
apareçam 70 e tantas vezes na televisão.
Todos
nós, pelo menos quem tem menos de 50 ou 60 anos, compramos e embarcamos nesta
ideia. Crescemos vendo corridas em pistas de 3 ou 4 km. Quando vemos uma pista
com 7 km, já vemos como algo “diferente”.
Assistir
ao GP em Nordschleife me fez pensar em como o automobilismo foi, ou vai, se
apequenando ao longo dos anos, como vai se tornando cada vez mais um esporte de
bibelôs, de meninos hábeis e envoltos de segurança exagerada, e vem deixando de
ser uma atividade para aqueles que já foram os seres mais corajosos, de maior
bravura, e cujo objetivo ao se tornarem pilotos era o de superar, no braço, as
dificuldades que uma pista e um carro lhes impunham. O velho Nurburgring
desafiava os pilotos em todos os aspectos, era o exemplo da razão – acredito –
pela qual muitos seguiam o caminho das corridas. Pela satisfação pessoal, não
para se tornar rico ou popstar.
Muitos
ainda acreditam que o caminho dos últimos anos é o correto. Sim, foi “apenas”
um fim de semana de WTCC, e muitos argumentarão – até com razão - que essa
prova não significa que estamos próximos de uma mudança de cultura. Eu mesmo
argumento que o próprio WTCC talvez não sirva de parâmetro de uma categoria de
peso, já que – apesar de ser um certame mundial da FIA – não se trata de um
campeonato ranqueado no topo das categorias do automobilismo. Sequer entre as
categorias de turismo.
Mas
eu prefiro encarar o fim de semana de corridas em Nordschleife como uma
excelente oportunidade. Antes
de tudo, uma oportunidade para que todos nós possamos rever certos conceitos.
Ao assistir à corrida em Nurburgring, vemos que corridas assim, ainda que como
exceção, podem existir. É possível sim posicionar fiscais, câmeras de TV,
pontos de atendimento em uma pista de 23, 24 km. O WTCC mostrou que é possível
“sobreviver” a corridas como a deste final de semana.
Oportunidade
para Confederações, organizadores e a própria Federação Internacional vejam que
este tipo de corrida mexe com as pessoas. O número de barracas e pessoas
acampadas próximas a pista é uma prova disso. Mais importante do que o lucro, é
importante criar um vínculo com espectador. O fascínio das pessoas por uma
pista, por um traçado, é suficiente para arrastar multidões a um autódromo.
Quem já foi a algum dos grandes circuitos do planeta sabe disso. Como
dirigentes, eles deveriam saber.
Oportunidade
para que emissoras de TV entendam que com a tecnologia e os recursos de hoje, é
muito mais fácil transmitir e coordenar a transmissão de um GP numa pista de 20
km do que nos anos 50, 60 e 70, quando essas pistas eram usadas. Basta ter
iniciativa.
Oportunidade,
enfim, para refletirmos. Precisávamos mesmo ter perdido estas pistas? Em que
momento a obsessão com a segurança nos fez seguir a filosofia de que somente as
pistas curtas, muitas delas enfadonhas e repetitivas, trariam segurança ao
automobilismo?
Em
que ponto da história o desafio de pilotar perdeu para o temor ao risco de
acidentes?
ESta lá.
ResponderExcluirVocê não sabe o quanto fico feliz em saber que vai voltar a escrever.
Fez muita falta.
Um ponto ai, os simuladores são incrivelmente realistas no inferno verde, uma volta de fórmula demora em média 6:00.000 ou uns 5:50:000,é desafiador, mas na vida real, realmente estar lá deve ser um feito por fãs e pilotos
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